Assunto: Cultura, Liderança e Gestão Tempo de leitura: 07 minutos
Porque modelos tradicionais de gestão e comando estão perdendo seus funcionários e não estão conseguindo novos profissionais?
Por milênios, o trabalho foi a fonte exclusiva de subsistência, para alimentação, proteção e reprodução. Necessidades essas que se estendem até os dias de hoje para uma grande faixa da nossa população mundial. Onde cerca de 1,9 bilhões de habitantes vivem com menos de U$3,4 dólares por dia.
Contudo, nos grandes centros urbanos, industriais e rurais, o trabalho transcende essa necessidade de trabalhar para viver, passando para uma única finalidade que é o dinheiro. Isso acontece, porque a sociedade nestes núcleos sociais têm conseguido atender as necessidades primárias por completo, de forma ininterrupta e sem escassez para um significativo grupo da população.
O que possibilitou às pessoas olharem para as outras dimensões que completam o ser humano. Por isso termos como propósito, sentido na vida, felicidade, tempo livre, bem-estar e qualidade de vida, se tornaram ponto central na busca do ser humano neste momento. O que acabou por se estender ao trabalho, na busca de ambientes que fomentem a relação e a conexão entre as pessoas, status e realização para os Egos e saúde mental e física para se alcançar a felicidade.
Devido a inúmeros estudos divulgados por diferentes instituições e universidades pelo mundo, que relacionam que quanto maior a felicidade de um colaborador, maior será o seu engajamento, cooperação, inovação, produtividade e lucratividade das empresas. Assim, a felicidade está se tornando o objetivo a ser alcançado também na gestão de pessoas.
O que precisamos entender é que não é possível ser e ter pessoas felizes, já que isso é uma consequência de condições internas e externas do ser humano. Mas é necessário avaliar se as pessoas consideram que têm um bom trabalho, se elas se sentem bem com o que fazem e com os colegas com os quais convive, essas são condições importantes conforme apontam algumas pesquisas.
O Instituto Gallup constatou em uma pesquisa sobre felicidade em mais de 155 países, que o fator determinante para ser feliz não está em ser rico, também não é a saúde e muito menos a família. O fator número um é ter um bom trabalho, que tenha significado e que seja compartilhado com colegas que acreditam no mesmo.
Se sentir bem e satisfeito no trabalho é tão importante que, conforme pesquisa do professor de medicina Nortin Hadler da UNiversity of North Carolina, sobre as causas sistêmicas do alto risco de mortalidade, um dos dois fatores principais para definir o risco de morte de uma pessoa é a satisfação e a felicidade com o seu trabalho.
Quanto menor o nível de satisfação com o trabalho, maior o risco de morte. Ou seja, quando uma pessoa não se sente valorizada e reconhecida, o que ela faz não é importante, não percebe que está fazendo a diferença. Ou não existe uma relação de respeito, ética, bondade e verdade. Onde a sua presença é indiferente, não possui conexão com outras pessoas da empresa, ou não se sente pertencente ao grupo. Ou ainda, não possui uma autonomia e controle sobre seu trabalho, onde suas ideias e opiniões são ignoradas, maior será o risco de morte.
Isso se comprova pela quantidade de infartos que acontecem ao longo de uma semana, onde a taxa de ataques cardíacos cresce 20% nas manhãs de segunda-feira. Como também o nível crescente de afastamentos por motivos como depressão, ansiedade e burnout registraram a maior alta entre as principais doenças indicadas como razão para o pedido do benefício. O número de concessões aumentou 33,7% de 2019 para 2020. A duração média, nos casos de doença mental, é de 196 dias.
As pessoas estão exaustas, por serem vistas como um número nos balanços financeiros da companhias, onde o motivo de uma demissão é justificada como uma redução de custos e as entregas devem ser feitas ao esforço e dedicação de 12 a 14 horas por dia e também fins de semana.
Outro sintoma que mostra a urgência que as empresas precisam se adaptar a essas novas necessidades do mercado de trabalho é a grande dificuldade para se encontrar trabalhadores para funções iniciais e especializadas. Isso acontece, porque as empresas continuam com um pensamento linear e cartesiano de comparar salário de uma determinada função com a média de mercado.
As empresas precisam compreender que vivemos em uma sociedade sistêmica, as pessoas não procuram mais uma função para trabalhar, mas uma oportunidade de viver e se desenvolver que não está mais vinculada especialmente ao que conhecemos como cargo(profissão exercida dentro da empresa).
Ao procurar um emprego a pessoa tem uma gama de oportunidades, quando oferecem salários de entrada abaixo de R$2000, ela passa a considerar outras opções desde trabalhar como entregador ou motorista de aplicativo até abrir seu pequeno negócio. Nestas possibilidades ela pode fazer seu horário, trabalhar como, onde quiser, sem ter um chefe para prestar contas o tempo inteiro porque não confia nele ou não precisar trabalhar em lugares fechados sem ver a luz do dia, por chegar antes do sol nascer e sair depois que ele se põe e além de evitar todo esse constrangimento, poder ganhar mais.
Outro grande indício de que as coisas precisam mudar é o movimento que está acontecendo nos EUA, que levou 24 milhões de pessoas a pedirem demissão entre abril e setembro de 2021.
Algo que é complementar ao estudo apresentado anteriormente pelo Instituto Gallup, foi a pesquisa realizada na empresa Virgin, com as pessoas que realmente amavam seu trabalho e a empresa, perguntando a elas “qual o maior motivo para eles amarem trabalhar lá?” 40% responderam, que era por causa de quem estava em sua volta, os colegas de trabalho, entendendo que a empresa possibilita estar, todo dia, ao redor de pessoas que elas gostam.
As pessoas por natureza necessitam se sentir pertencentes a um grupo onde ela se sinta respeitada e exista uma relação humana olho no olho entre as pessoas que ela convive. As pessoas precisam sentir que seu trabalho é importante e faz a diferença para algo ou alguém por mais simples que seja. Percebendo que ela tem autonomia de fazer as suas tarefas.
Como cita o Co-CEO do Whole Food`s Market John Mackey:
“A culpa não é do profissional supostamente preguiçoso e desmotivado, e sim da empresa que não conseguem criar postos de trabalho dos quais as pessoas tenham a oportunidade de extrair significado, propósito e felicidade para sua própria vida ao contribuir para o desenvolvimento da empresa.”
A mentalidade “pago um salário, você me vende suas horas”, está mudando. Hoje as empresas não estão conseguindo mão de obra para novas vagas, os funcionários atuais estão pedindo demissão em um maior número. Para se ter uma ideia, são tantas pessoas pedindo demissão que, em um ano, a rotatividade por demissão representou 15% das vagas com carteira assinada e esse número tem crescido muito nos últimos anos.
Se nada for mudado o próximo passo será não ter clientes para comprar produtos e serviços, por conhecer as condições de trabalho que essas empresas utilizam.
Repensar a forma como as empresas por meio da gestão de pessoas se relaciona com seus funcionários é uma questão de sobrevivência e também de lógica. Porque se as empresas querem clientes mais felizes e satisfeitos com seus produtos e serviços, e maior lucratividade é preciso entender que são os seus colaboradores que atendem esses clientes. Existe uma relação direta quanto maior a felicidade de um funcionário, melhor ele atenderá os clientes e com isso maior será o nível de satisfação. O que resultará no longo prazo nos maiores lucros, que irão remunerar ainda mais acionistas e toda a cadeia.
Autor: Daniel Fünkler Borelli
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