Assunto: Gestão de Pessoas, Liderança e Cultura Tempo de leitura: 04 minutos
Vivemos um momento de queda da taxa de desemprego, saindo dos 14,7% em março de 2021, para os 8,7% de setembro de 2022. O que resulta num ambiente com grande oferta de empregos porém com um baixo nível de preparo das pessoas disponíveis no mercado.
Somado ao pensamento imediatista do ecossistema econômico brasileiro, onde tudo é urgente, frente à um crescimento econômico de 4,6% em 2021 e de 2,8% previsto para 2022. Fazem com que as pessoas sejam colocadas para trabalhar no menor tempo possível para atender aos pedidos e projetos dos clientes que estão em grande atraso e em demanda crescente.
Todo esse contexto colabora para que as empresas e, principalmente, as lideranças tragam pessoas para dentro da empresa sem critério e adequada preparação. Descuido de todo o ciclo de experiência e relacionamento das pessoas que estão, estarão ou deixarão de estar na empresa. Essa desatenção traz grandes impactos negativos à empresa como:
- Elevação dos custos da empresa, com os processos de contratação e desligamento.
- Queda de produtividade, já que a cada novo funcionário você tem que disponibilizar uma pessoa experiente para ensinar e acompanhar, resumindo 2 pessoas que não estão entregando os resultados esperados.
- Redução nas vendas, ocasionada pelo crescimento no número de problemas de qualidade, maior atraso nas entregas e baixa qualidade no atendimento, devido a inexperiência das pessoas contratadas.
- Perda do conhecimento adquirido com a experiência, conhecimento que não se encontra em processos, instruções ou sistema de trabalho, mas ajudam a empresa a atalhar caminhos nas decisões e resolução de problemas.
- Desaparecimento da cultura de identidade da empresa, perda dos valores e comportamentos desejados e dos balizadores e critérios para as escolhas, bem como o motivo de existir e o direcionador da empresa.
- Clima de insatisfação, reclamação e desgaste da imagem interna e externa da empresa, interna com o aumento dos conflitos, morosidade nas ações, sensação de insegurança e instabilidade. Externa por não conseguir novas pessoas, especialmente os melhores profissionais para preencher as vagas e, também, a insatisfação de clientes, fornecedores e parcerias da empresa.
Esse cenário negativo é decorrente das condições de como a empresa, os líderes e os gestores conduzem, operacionalizam e relacionam-se com as pessoas e se apresenta devido as seguintes lacunas:
Ausência de um sistema de reconhecimento
As empresas não possuem um sistema de reconhecimento, elas focam exclusivamente em promoções e aumentos de salários, elementos esses que não aumentam efetivamente o engajamento. Esses elementos são ações que demandam esforço de longo prazo por parte das pessoas, ficando uma lacuna na valorização do esforço e empenho das pessoas de curto e médio prazo.
Por isso, criar políticas que transcendem os aspectos salariais, como abordei em meu último artigo NÃO UTILIZE FEEDBACK POSITIVO PARA RECONHECER E VALORIZAR é o caminho para criar as condições para comprometimento, motivação e permanência das pessoas.
Contratar as pessoas pelo conhecimento técnico
Os líderes e os gestores insistem em avaliar as pessoas apenas pelo seu currículo técnico, diplomas e certificados e não considera ou determina como ponto decisório para contratar ou não a dimensão comportamental.
Em seu livro Inteligência Emocional, Daniel Goleman declara que pessoas de sucesso têm 66% de suas habilidades relacionadas ao Quociente Emocional (QE) e apenas os 33% restantes estão envolvidas ao Quociente Intelectual (QI).
É importante salientar que são as condutas e atitudes que estão conectadas diretamente a inteligência emocional de cada pessoa, que determinarão a qualidade de entrega, engajamento, empatia e conexão com a equipe e os resultados que garantirão a aderência à cultura, sucesso e continuidade desta pessoa na empresa.
Benefícios e incentivos da empresa não atende as pessoas
Não existem programas de benefícios e incentivos que sejam convergentes aos motivadores e necessidades dos colaboradores. Isso porque as empresas ainda acreditam que atender somente as necessidades fisiológicas e de segurança é o suficiente para mobilizar e envolver as pessoas com a empresa.
Entretanto, uma pesquisa de 2001 sobre propósito da Amy Wrzesniewski (Yale School of Management) e Jane Dutton (Universidade de Michigan), mostrou como as pessoas veem o trabalho:
Emprego: Atividade a ser suportada em troca de um salário.
Carreira: Quandoo trabalho oferece prestígio ou uma posição na sociedade.
Missão: Trabalho que você considera parte integral da sua identidade e do sentido de vida.
A empresa precisa ter claro para todos que fazem parte dela, como ela atende essas necessidades e motivadores. Principalmente no âmbito de carreira e missão, aspectos que na grande parte das empresas são desconhecidos, ignorados ou inexistentes.
Sistema de remuneração
As empresas precisam compreender que vivemos em uma sociedade sistêmica. As pessoas não procuram mais uma função para trabalhar, mas uma oportunidade de viver e se desenvolver que não está mais vinculada especificamente ao que conhecemos como cargo.
Para isso, a empresa precisa rever os salários dos cargos iniciais, pois qualquer pessoa hoje consegue salários maiores do que R$ 3000,00, como motorista de aplicativo, entregador ou abrindo seu próprio negócio.
Outro ponto que impacta a alta rotatividade, pois colabora para o sentimento de injustiça, é os líderes não respeitarem as regras de remuneração criando desequilíbrio entre pessoas com funções menos complexas que recebem mais do que pessoas que atuam em processos de trabalho mais complexos e de maior contribuição para o negócio.
Isso acontece nas empresas por dois motivos: primeiro, a empresa não tem um quadro de lotação definido de quantas pessoas são necessárias em cada função para atender a demanda e os processos da empresa. Segundo, não possui uma tabela com as especificações:
Funções X Impacto X Complexidade = Salário
Que funciona como balizador, com dados do porque uma pessoa deve ganhar determinado salário na empresa, não deixando sobreposição de salários em diferentes cargos ou entregas e, muito menos, por alguém fazer mais ou menos.
Não visualiza as possibilidades de crescimento
Não existe clareza em como as pessoas podem trilhar um caminho de crescimento horizontal, vertical ou de estabilidade dentro da empresa. Por não existir opções de carreira com seus respectivos cargos, ou também, pela empresa acreditar que “o santo de casa não faz milagre” e que a grande solução virá de alguém de fora da empresa e, assim, quando existem oportunidades a empresa opta em contratar pessoas de fora.
Neste caso é fundamental oportunizar e promover pessoas da própria empresa, demonstrando que é possível crescer, evoluir e ser valorizado pelas entregas e dedicação à empresa.
Líderes não fazem a gestão de pessoas
Muitos líderes têm a visão que os funcionários somente buscam trocar seu tempo por dinheiro, claro que existem pessoas que pensam e trabalham desta maneira. Contudo, a grande maioria busca outros elementos que vão além de salários e a relação com a liderança é a principal. Em 2017, a consultoria Gallup identificou que 75% das pessoas que se demitiram o fizeram por causa de seus(suas) chefes.
As lideranças precisam entender que o engajamento e o vínculo das pessoas não acontece com a empresa, produto, processo, marca ou serviço mas, sim com as pessoas. Desta maneira, é fundamental que líderes atuem em uma relação mais próxima com as pessoas da sua equipe, de forma coletiva mas, principalmente, individual, com diálogos constantes, como ferramentas de escuta ativa, conversas de empatia e confiança, meeting 1:1, feedbacks, reconhecimento e feedforward.
Condições psicológicas inadequadas
Por muito tempo a grande preocupação das empresas foi com os acidentes físicos com o colaborador. Mas estamos em uma transformação do trabalho braçal para o mental e as doenças psicológicas estão crescendo rapidamente. Para se ter uma ideia, em 2017 elas já representavam a 4º causa de afastamento no trabalho no Brasil, com 169 mil casos, o que significou 7,2% do total das notificações. Chegando em 2021 ao seu auge, em 3º colocado, com 285 mil casos, equivalente a 12,7% do total, o que demonstrou um aumento no número de casos de 68,6% de 2017 a 2021.
Além da mudança do formato e significado do trabalho, também deixou de existir uma separação entre pessoal e profissional, problemas pessoais como financeiro até alguns anos atrás não impactavam no trabalho. Mas atualmente, segundo dados da PwCs, 49% das pessoas confirma que despendem no mínimo 3 horas por semana no trabalho para resolver problemas financeiros.
Os problemas do ambiente profissional com busca de metas e entrega de resultados, somados às questões existenciais, status, familiares e financeiras, estão trazendo graves problemas à saúde psicológica e, por efeito subsequente, física dos colaboradores.
O que acarreta queda de performance e da entrega dos resultados individuais e coletivos, o que, por consequência, impacta negativamente nos resultados financeiros da empresa. Por isso, conhecer, ajudar e apoiar as pessoas é fundamental para o maior foco das pessoas com os resultados que a empresa busca alcançar e menos com suas questões pessoais.
Não se sente parte da empresa
O Instituto Gallup constatou em uma pesquisa sobre felicidade em mais de 155 países, que o fator determinante para ser feliz não está em ser rico, também não é a saúde e muito menos a família. O fator número um é ter um bom trabalho, que tenha significado e que seja compartilhado com colegas que acreditam no mesmo.
Entretanto, as pessoas se sentem distantes umas das outras, distância essa que se ampliou com os trabalhos híbridos ou homework. Tornando as relações e conexões inviáveis para as pessoas, já que as interações nesses formatos se resumem às entregas realizadas, problemas a serem resolvidos e decisões a serem tomadas.
Criar um momento de convivência entre colegas, onde possam dialogar sobre diversos assuntos, afinidades e que possam se conhecer mesmo que em ambiente on-line é necessário para a construção da confiança, elemento base para o aumento da velocidade na tomada de decisão, resolução de problemas e aumento da produtividade e envolvimento das pessoas. Bem como a troca de ideias para a construção de um ambiente de melhoria e inovação que as empresas tanto almejam.
Outro fator que aumenta o envolvimento das pessoas está relacionado ao nível de participação nas decisões, resoluções de problemas e autonomia em como as pessoas podem realizar suas entregas. Aumentar o grau de compartilhamento e contribuição para com as pessoas elevará o nível de pertencimento e comprometimento com a empresa.
Não é reter pessoas mas cativar e encantar
Os líderes que inspiram e encorajam são aqueles que têm clareza no objetivo e reconhecem de modo espontâneo e autêntico o esforço dos outros. Ex-CEO Jonh Mackey e Raj Sisodia os idealizadores do Capitalismo Consciente trazem:
“A Culpa não é do profissional supostamente preguiçoso e desmotivado, e sim da empresa que não consegue criar postos de trabalho nos quais as pessoas tenham a oportunidade de extrair significado, propósito para sua própria vida.”
É preciso entender que a relação e o significado com o trabalho mudou, e vai muito mais além que uma simples troca monetária. As empresas que entenderem rapidamente esta mudança serão aquelas que conseguirão os melhores profissionais e terão as pessoas mais engajadas, o que contribuirá diretamente para as ideias mais inovadoras, que tornarão os clientes mais satisfeitos, que terão os maiores ganhos financeiros e pagarão os maiores valores aos sócios e acionistas.
Autor: Daniel Fünkler Borelli
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