A pressão incessante por resultados tornou-se uma prática comum em muitas organizações, especialmente em setores altamente competitivos, sendo exercida por líderes, gestores e pelos próprios donos. Embora os resultados sejam fundamentais para a sustentabilidade de qualquer negócio, o foco obsessivo em metas agressivas e na produtividade incessante pode criar ambientes organizacionais tóxicos, prejudicando a saúde mental dos colaboradores, minando a capacidade de inovação e corroendo o desempenho sustentável e as relações com todos os stakeholders.

O Custo da Alta Performance Tóxica

Empresas que tratam resultados financeiro, como o único medidor de sucesso frequentemente empurram seus funcionários para limites insustentáveis. Práticas comuns incluem:

  • Jornadas de trabalho excessivamente longas, vistas como sinal de comprometimento e emprenho;
  • Metas de vendas ou produção irrealistas, que criam pressão constante e medo de represálias;
  • Competitividade interna exacerbada, onde o mais importante e gastar o meu tempo para me proteger com evidencias e provas do que contribuir para os resultados com foco no individualismo;
  • Sobrecarregar os funcionários em vez de melhorar processos: Em vez de revisar fluxos de trabalho ou automatizar tarefas repetitivas, a solução é pedir ‘mais esforço’ das pessoas.
  • Corte de custos com redução drástica de pessoal ou de investimentos essenciais, visando apenas aumentar o lucro imediato.

Esses cenários alimentam um ciclo destrutivo de burnout, no qual a exaustão física e mental compromete a produtividade e reduz a motivação. Para se ter uma ideia, um estudo com 15.809 adultos trabalhadores nos EUA em 2022 identificou que os trabalhadores com saúde mental regular ou ruim utilizam quase 12 dias de ausências não planejadas anualmente, em comparação com 2,5 dias para os demais trabalhadores. Isso representa um custo estimado de U$ 2.000,00 por dia perdido, além de outros problemas, como aumento da propensão a erros, insatisfação de clientes e alto turnover, ampliando os custos com recrutamento e formação de novos profissionais.

Exemplos das Consequências da Pressão por Resultados

Em 2015, a Volkswagen foi flagrada usando um software para fraudar testes de emissões de veículos a diesel, fazendo com que os carros aparentassem ser menos poluentes do que realmente eram. Estima-se que cerca de 11 milhões de veículos foram afetados em todo o mundo. A empresa teve que pagar mais de US$ 30 bilhões em multas, indenizações e recalls em diversos países, especialmente nos EUA e na Europa.

Em 2016, o Wells Fargo foi flagrado abrindo milhões de contas bancárias falsas sem o consentimento dos clientes, em um esforço para bater metas agressivas de vendas. O escândalo gerou multas bilionárias, perda de clientes e credibilidade, além da demissão de executivos de alto escalão e mudanças profundas na cultura do banco.

O caso da Uber em 2017 mostrou como uma cultura corporativa agressiva pode comprometer a reputação e a sustentabilidade de um negócio, resultando em perda de confiança do público, dificuldade em atrair e reter talentos, queda no valor de mercado e maior escrutínio regulatório. Denúncias de assédio, discriminação e pressão excessiva levaram à saída do CEO, mudanças na governança e revisão da cultura organizacional.

O caso mais grave custou vidas humanas: em 2018 e 2019, a Boeing enfrentou uma grande crise após dois acidentes fatais envolvendo o 737 MAX, que mataram 346 pessoas. Foi revelado que a empresa priorizou custos e velocidade de produção em detrimento da segurança, ocultando falhas no sistema MCAS. O caso levou à paralisação global da aeronave, perda de bilhões em valor de mercado e danos duradouros à reputação da empresa.

Para aqueles que pensam que isso só acontece fora do Brasil, há exemplos locais: em janeiro de 2023, a varejista brasileira Americanas revelou um rombo contábil de R$ 20 bilhões, relacionado a práticas de “risco sacado” ocultadas por anos em seus balanços. A revelação levou à perda de mais de 80% do valor de mercado em poucos dias, à renúncia do CEO recém-nomeado e ao pedido de recuperação judicial, com dívidas superiores a R$ 40 bilhões.

Em janeiro de 2019, a barragem de Brumadinho, operada pela Vale, se rompeu, causando a morte de 270 pessoas, muitas delas funcionárias da própria empresa, e resultando em uma grande devastação ambiental. A tragédia foi atribuída a falhas nos sistemas de segurança e à falta de ação preventiva em relação ao risco iminente. Um acordo de R$ 170 bilhões foi firmado para reparações, sendo R$ 38 bilhões já efetivados.

Todos esses casos ilustram como o foco e a ganância pelo lucro de curto prazo comprometem a sustentabilidade das empresas. E esses são apenas exemplos de grandes corporações com estruturados sistemas de governança onde são auditadas e listadas no mercado financeiro; quantas outras práticas semelhantes permanecem fora do radar público como sonegações fiscais, desvios de estoques e suborno presente em empresas de pequeno a grande porte.

Consequências para a Inovação e o Crescimento Duradouro

Em um ambiente de pressão constante, os colaboradores direcionam sua energia para a sobrevivência, como se diz na linguagem técnica “Não deixar o seu na reta.” preocupando-se muito mais em registrar, comprovar, explicar, evidenciar, fazer gambiarras, em vez de se concentrar nas entregas dos resultados. Quando o foco está em encontrar culpados, as pessoas tendem a priorizar sua proteção pessoal, em detrimento da contribuição com os resultados. Criando a condição perfeita para a falta de segurança psicológica que impede que as pessoas compartilhem ideias ou admitam erros, elementos essenciais para o aprendizado e o progresso. A punição, o controle excessivo e a coação, direcionados às pessoas e não aos processos, produtos ou sistemas, corroem a criatividade, a colaboração e, por fim, a verdadeira produtividade.

Consequências da Pressão Excessiva

  1. Aumento da Rotatividade e Absenteísmo por Doenças Mentais Empresas focadas na pressão constante registram altos índices de afastamentos devido a transtornos como ansiedade, depressão e burnout. Esses problemas drenam a produtividade e criam ciclos de substituição e treinamento.
  2. Sem estrutura e conhecimento Pessoas trabalham sem conhecimento e os recursos apropriados e o suficientes elevando o tempo de trabalho, e a ocorrência de acidentes e problemas de qualidade e entrega
  3. Deterioração do Clima Organizacional O medo e a cobrança exacerbada geram ambientes tóxicos, comprometendo a colaboração, confiança e por consequência a inovação.
  4. Ocultamento de Erros e Gambiarras Operacionais Funcionários sob pressão escondem erros ou recorrem a soluções improvisadas para evitar punições, comprometendo a integridade operacional.
  5. Elevada insatisfação dos Clientes, devido ao péssimo atendimento nos serviços prestado ou comercializados, atrasos nas entregas e a fabricação de produtos defeituosos.
  6. Ausência de Reconhecimento e Desmotivação A falta de reconhecimento pelos esforços cria descontentamento, especialmente quando as pessoas da empresa não veem melhorias tangíveis para os colaboradores. Somente o lucro beneficia os gestores, mas principalmente os donos da empresa, que focam em obter o maior lucro em benefício próprio, para manter sempre atualizada a sua BMW, sempre zero km.

Foco em Stakeholders (partes interessadas), Não Apenas em Shareholders (acionista)

É fundamental que as empresas adotem uma visão mais ampla e duradoura de sucesso, direcionada não exclusivamente aos shareholders, mas aos stakeholders como um todo. Isso inclui funcionários, clientes, fornecedores e a comunidade. O verdadeiro valor de uma organização não está apenas no lucro imediato, mas no impacto positivo e de longo prazo que gera para todas as partes interessadas, criando um equilíbrio entre desempenho financeiro e contribuição social.

Práticas Sustentáveis para Gerir Resultados

  1. Estabelecer a Segurança Psicológica: A Barry-Wehmiller demonstra como cuidar das pessoas cria ambientes onde elas se sentem valorizadas e seguras para inovar e entregar o seu melhor.
  2. Definição de Metas Realistas: Estabeleça conjuntamente com a equipe os objetivos, deixando as pessoas, de forma coletiva ou individual, propor suas metas convergentes aos objetivos estratégicos.
  3. Valorizando o Equilíbrio: Incentivar pausas e desconexão fora do horário de trabalho para garantir produtividade sustentável.
  4. Conversas Individuais: Oportunizar conversas individuais para levantar os principais problemas e dificuldades que o liderado esteja enfrentando e que podem estar impedindo a entrega dos resultados.
  5. Medição de Sucesso: Avaliar o desempenho com base no bem-estar das pessoas, indicadores do clima da empresa, número de melhorias implementadas, índice de satisfação de clientes e fornecedores, % de investimento na empresa para manutenção da estrutura e inovação, entre outros que vão além de resultados financeiros.

Liderança Baseada no Diálogo e Propósito Compartilhado

O líder contemporâneo deve gerar resultados duradouros por meio do diálogo, conectando a relevância das metas ao propósito organizacional e assegurando que os benefícios sejam compartilhados com todos os stakeholders. Práticas que valorizam respeito, inclusão e foco no bem-estar criam um ciclo virtuoso de crescimento e inovação, promovendo um sucesso genuíno, fundamentado na harmonia entre produtividade e saúde humana.

Diferente do que muitos donos e líderes de empresas pensam, que trabalhar desta maneira aumenta os custos e corrói o lucro, dados de pesquisa da Humanizadas de 2023, com uma base de 12 anos, mostram que empresas que seguem essas ou outras práticas possuem um retorno 615% maior que a média das empresas do IBOV.

Não podemos mais aceitar que o lucro se imponha à custa da destruição ambiental, da falência de empresas, da pobreza e da perda de saúde e dignidade humanas. O verdadeiro resultado empresarial deve ser fruto da criação de soluções, benefícios reais e do atendimento às necessidades essenciais da sociedade.

Se uma empresa precisa manipular demandas, explorar mão de obra pagando baixos salários ou comprometendo a saúde física ou mental, forçar a venda de produtos irrelevantes ou impor prazos de pagamento abusivos a fornecedores, isso expõe uma falha estrutural profunda: a incapacidade de criar valor genuíno e sustentável para a sociedade. Organizações que operam com base na exploração, no oportunismo ou na negligência do bem comum comprometem a própria legitimidade e não têm espaço em um futuro orientado por propósito, responsabilidade e impacto positivo.

Que tipo de legado você, líder, gestor e empresário, quer deixar como exemplo de liderança e empresa? É hora de reimaginar o sucesso corporativo, construindo negócios que prosperem ao equilibrar desempenho econômico com progresso humano e planetário.

Autor: Daniel Fünkler Borelli

Presenteie este artigo a um amigo ou, se preferir, compartilhe-o com todos os seus amigos em suas redes sociais.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *